

Luciana Beek da Silva
O direito contratual moderno é formado por princípios que transcendem o mero interesse individual das partes contratantes. O legislador positivou princípios que já vinham sendo aplicados pelos Tribunais pátrios, no julgamento de lides e divergências entre contratantes.
No Código Civil de 1916, o direito contratual era baseado em princípios liberais, com interferência mínima do Estado, prevalecendo o princípio do "pacta sunt servanda": o contrato é lei entre as partes.
Porém, o direito evoluiu, acompanhando as mudanças, transformações e anseios sociais, proteção do hipossuficiente – o que ocorre com o consumidor perante as grandes corporações, contratação em massa e contratos de adesão - preocupações ambientais, levando à mudança legislativa e interpretativa dos contratos.
Pode-se dizer que a Constituição Federal de 1988 modificou o eixo axiológico do direito, estampando novos princípios norteadores do sistema. A função social e a boa-fé ocupam o lugar da liberdade, limitando-a.
Há três princípios norteadores do direito contratual moderno: a boa-fé objetiva, a função social e o equilíbrio econômico ou comutatividade.
As partes são obrigadas a observar a boa-fé em todas as fases contratuais, ou seja, desde a formação do contrato, durante a execução e na fase pós-contratual, devendo manter a legítima expectativa durante e após a execução do objeto contratual.
O Código Civil de 2002 trouxe expressamente a função social como limitadora da liberdade de contratar, em seu artigo 421, que contém atualmente a seguinte redação: “A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato”.
Em diversos outros dispositivos, há princípios que orientam as partes contratantes e o juiz na interpretação dos contratos que autorizam a revisão contratual em casos excepcionais.
Assim, a participação do advogado na negociação, elaboração e acompanhamento da execução do contrato é essencial a fim de que haja clareza e os termos do contrato reflitam exatamente o propósito negocial.
Nesse âmbito, a atuação do advogado ocorre de maneira preventiva, antecipando problemas e evitando futuras demandas judiciais, trazendo maior segurança jurídica ao dia a dia da empresa e minimizando custos.
Renata Bes
O poder de direção é o poder inerente à figura do empregador. É o poder de comando que é materializado em três outros poderes: poder de organização, poder disciplinar e poder de fiscalização.
Todavia ante a necessidade de limitação destes poderes, começaram a surgir normas e convenções tuteladores das garantias individuais, buscando diminuir o autoritarismo do empregador, concedendo aos empregados maiores benefícios, durante o passar do tempo.
O artigo 482 da CLT relaciona as causas que constituem falta grave do empregado a ensejar a justa causa para rescisão do contrato de trabalho.
Apesar de não haver na legislação vigente qualquer previsão quanto à gradação das penas ou obrigatoriedade de aplicação de advertência ou suspensão antes da demissão por justa causa, o que vimos na prática é a sua necessidade.
Existem cinco espécies de penalidades aos empregados, entre elas, a suspensão disciplinar, a advertência, a multa (apenas em alguns casos, como de atleta profissional), a repreensão, e a pena de despedimento por justa causa, sendo as três primeiras, as mais aplicadas.
Na maioria dos casos em que ocorre a justa causa, para sua manutenção em ação judicial, faz-se necessária a comprovação da gravidade do ato faltoso e/ou que houve a gradação das penas.
Isto porque a demissão por justa causa é medida severa que deve ser usada pelo empregador em casos extremos.
Por exemplo, para que um funcionário desidioso seja demitido por faltas injustificadas, não basta que este tenha faltado diversas vezes durante o contrato de trabalho. A empresa precisa comprovar que o advertiu algumas vezes por conta disso, e após aplicou-lhe suspensão antes da demissão.
Além disso, o empregador deve pautar pela proporcionalidade entre a falta cometida e a penalidade aplicada e jamais aplicar duas punições pelo mesmo fato. Caso contrário, a justa causa certamente será revertida em ação judicial.
Importante frisar que ônus da prova da justa causa é do empregador, competindo a este comprovar que a punição foi corretamente aplicada (artigo 818 da CLT).
Outra questão importante, é que a justa causa deve ser aplicada imediatamente após a ocorrência do ato pelo empregado ou do conhecimento deste pelo empregador, sob pena de ocorrer o perdão tácito. Contudo, não se pode considerar que houve o perdão em casos em que o empregador precisa de maior tempo para analisar e/ou investigar o ocorrido, após o conhecimento desta falta cometida.
Assim, as situações devem sempre ser analisadas caso a caso, aplicando-se ao funcionário faltoso as devidas sanções, sejam elas advertências verbais ou escritas, suspensões e, por fim, a demissão por justa causa, observando-se a proporcionalidade da punição e a gradação das penas, evitando-se a injustiça e a reversão em eventual ação judicial.
Luciana Beek
A lei consagrou a personalidade jurídica das sociedades, que não se confunde com a de seus sócios, bem como a autonomia patrimonial da pessoa jurídica, o que possibilitou o incremento do desenvolvimento econômico e a lícita alocação de riscos. Com efeito, a autonomia da personalidade jurídica tem fundamento constitucional, qual seja, o principio da liberdade de iniciativa e economia de mercado.
A personalidade jurídica distinta da personalidade dos sócios e o princípio da autonomia patrimonial da empresa estão previstos nos artigos 49-A e 1.024 do Código Civil, in verbis:
Art. 49-A. A pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)
Parágrafo único. A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos.
Art. 1.024. Os bens particulares dos sócios não podem ser executados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais.
Porém, tal situação dá ensejo, por vezes, ao cometimento de fraudes, motivo pelo qual a doutrina, a jurisprudência e, enfim, a lei criaram o mecanismo de desconsideração da personalidade jurídica.
O Professor Fabio Ulhoa Coelho, em sua obra Novo Manual de Direito Comercial – direito de empresa (32ª edição, Editora revista dos Tribunais, 2021, p. 141) assim define o instituto:
“... por vezes, a autonomia patrimonial da sociedade empresária dá margem à realização de fraudes. Para coibi-las, a doutrina criou, a partir de decisões jurisprudenciais (nos EUA, Inglaterra e Alemanha, principalmente), a “teoria da desconsideração da personalidade jurídica”, pela qual se autoriza o Poder Judiciário a ignorar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica sempre que ela tiver sido utilizada como expediente para a realização de fraude. Ignorando a autonomia patrimonial, será possível responsabilizar-se, direta, pessoal e ilimitadamente, o sócio por obrigação que originalmente cabia à sociedade.”
A desconsideração da personalidade jurídica está prevista, no ordenamento jurídico brasileiro, nos seguintes artigos de lei: art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, art. 34 da Lei Antitruste, art. 4º da Lei 9.605/98 (meio ambiente) e art. 50 do Código Civil:
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.
A desconsideração da personalidade jurídica deverá ser reconhecida através de incidente processual específico, conforme previsto no art. 133 do Código de Processo Civil, cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial, suspendendo o processo, salvo se o pedido de desconsideração for requerido em petição inicial.
Importante ressaltar que, conforme a regra geral contina no artigo 50 do Código Civil, os pressupostos para a desconsideração são - desvio de finalidade (assim entendido como utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza) e - confusão patrimonial (ausência de separação de fato entre o patrimônio da sociedade e dos seus sócios/administradores). Nota-se a necessidade do elemento subjetivo, da intenção de fraude.
Não basta, pois, a simples insolvência ou inadimplemento da sociedade no cumprimento de suas obrigações, havendo a necessidade da comprovação dos pressupostos previstos em lei, sem os quais o julgador deve privilegiar e manter a autonomia patrimonial da sociedade e a sua personalidade.
Alice B. Seraphim
Quando eu ainda trabalhava em uma Editora, duas amigas, me disseram: “Você vai trabalhar conosco em nosso escritório”.
Achei que era uma forma gentil de me tratarem. Mas, passados um ano mais ou menos, a Editora onde trabalhava, por opção dos dois diretores que tinham outros projetos, findou.
E eu desempregada, ainda sem projetar nenhum caminho, recebo a ligação de uma delas me dizendo: e agora já tem algo para fazer? Venha conversar conosco. Marquei e fui. Conversamos, acertamos e elas: -- “Pode começar amanhã?” Era uma quinta-feira; combinei de iniciar na segunda feira seguinte.
E neste ano de 2021, por incrível que pareça para mim, completarei 11 anos em um escritório de advocacia.
Lembro-me bem que eu disse, posso sim fazer algumas coisas que esperavam de mim, na área administrativa, onde tinha alguma experiência, mas não na financeira; não tinha nenhuma experiência nesta área. Lembro-me que elas disseram não precisa, precisamos mesmo de você organizando a área administrativa, temos uma moça na gerência financeira, e ela cuidará desta parte.
Para mim, foi muita surpresa tudo que vi. Foi tudo até muito pitoresco no meu início; organizando os sistemas de arquivo, me deparava com e-mails soltos que achava que não eram sérios e nem importantes para arquivo, até que fui aprendendo que eram relatos, mesmo as vezes naquela linguagem pouco ortodoxa, para serem guardados como provas para defesa. Estava aprendendo que na área de família, infelizmente temos casos não tão agradáveis e fáceis para lidar. E eu ví aquelas mulheres educadas, sensíveis e extremamente amorosas, lidarem com tudo isso.
E assim, fui caminhando nas minhas funções. E tanto nessa área como em outras áreas jurídicas em que elas atuavam, fui vendo a luta e o caminhar destas jovens senhoras, com muita força e coragem, para minha total surpresa, afinal as via como elegantes e sensíveis.
No início me admirei, uma vez queria retirar da recepção um livreto que contava piadas de advogados, destas que a gente sempre se depara. Fiquei novamente surpresa, quando elas sabiam e achavam graça, não viam como ofensa e riam. Mas, mesmo assim retirei o livreto; eu não as via assim.
Claro que com estas profissionais em direito, tão seguras, eloquentes e convincentes, em um belo dia, assumi algumas funções financeiras também.
Aprendi a admirar o seu trabalho, percebendo quanta aflição havia naqueles futuros clientes que chegavam em busca de socorro. As vezes cá com meus botões pensava, parece a área médica, onde a insegurança e o desespero daquelas pessoas necessitadas, pedem ajuda a um profissional que conheça o assunto, que as atendam, as socorram e acalmem; e nessa hora, eu via aquelas mulheres elegantes virarem mãezonas sensibilizadas com a situação, perdiam horas naqueles contatos, as vezes antes deles se tornarem clientes, e os acalmavam.
Percebi que nas reuniões com os futuros clientes, se inteirando completamente dos detalhes dos casos que surgiam para terem nas Ações os argumentos necessários, eram também essas reuniões, para se sensibilizarem com aquelas situações, poderem arregaçar as mangas e irem em frente com aquela força de leão em defesa daqueles clientes. Nas reuniões, também decidiam a aceitação ou não do cliente.
Me lembro de um caso onde elas já estavam trabalhando com um cliente, Vara de Família, e acreditavam era ele a parte sensível e inocente da situação, vítima de um irmão maldoso. Começamos, todos no escritório, a receber telefonemas de familiares desse cliente, se queixando e fazendo perguntas, etc. e nós, preocupados, fomos instruídos a solicitar que não ligassem, criavam uma situação constrangedora que feria a ética profissional . Mas foi tanta a insistência dos telefonemas, mãe, etc. etc.. que nossas líderes fizeram um apelo. Fariam uma reunião geral com todos, a outra parte, seu advogado e tentariam deixar mais clara e lúcida a situação para que não continuasse esse contato anárquico de todos os lados. Após esta reunião houve uma surpresa geral: nosso cliente, era quem estava tendo atitudes pouco corretas digamos, e elas percebendo que estavam em defesa de alguém com atitudes nada satisfatórias, abdicaram do caso. Esse cliente, que já havia percebido a capacidade das profissionais recém-contratadas, pediu de todas as formas que continuassem. Cheguei a ver um e-mail onde ele dizia que se para continuarem em sua defesa, ele precisasse ir até o escritório, e ajoelhar aos seus pés, iria. E realmente elas não continuaram, por não mais acreditarem na verdade deste cliente.
Também passei a admirar o cuidado do escritório praticando uma reunião semanal, em oração, já que todos somos cristãos, no sentido de pedir proteção para nós, nossas famílias, nosso escritório e nossos clientes, já que, claramente, um escritório de advocacia começou a me transmitir a ideia de um tipo de pronto socorro. E que luta em prol da vida! Antigamente achava que um advogado trabalhava, com conhecimento, bons argumentos e era apenas um representante legal, representativo de seus clientes. Hoje descobri que eles são peões. Acordam muito cedo, cansam os músculos em um computador, escrevendo textos e mais textos em defesas, petições, etc. ... não tem hora de trabalho, enfrentam situações complicadas, pessoas problemáticas e procuram preservar sua sensibilidade como podem em face de atos tão desagradáveis de um cotidiano que nem sempre é o seu.
Enfim, quis deixar registrado em mais de uma década de observação, quão humano um escritório de advocacia pode chegar a ser.
Luciana Beek
A exclusão do ICMS da base de calculo do PIS e da COFINS - julgamento definitivo da matéria
O Supremo Tribunal Federal decidiu, de forma definitiva, no último dia 13 de maio, por acatar a tese da exclusão do ICMS da base de calculo do PIS e da COFINS.
A matéria vinha sendo discutida nos Tribinais há mais de 20 anos, tendo o STF se pronunciado favoravelmente à tese, no julgamento da Repercussão Geral no Recurso Extraordinário n° 574.506, fixando que o valor do ICMS a ser excluído é o valor destacado em cada nota fiscal de venda.
O julgamento definitivo da questão possibilitará aos empresários que recuperem, de forma segura, impostos indevidamente pagos, a partir de 17/03/2017, data considerada como marco inicial, conforme entendimento da Corte.
Caso a sua empresa esteja sujeita ao recolhimento destes impostos, a possibilidade de recuperação poderá ser avaliada através de auditoria contábil que fundamentaria a ação judicial com esse objetivo, já que a recuperação do valor indevidamente pago não é automática, tampouco requerida no âmbito administrativo.
Além disto, considerando que na prática ainda não foram estabelecidas as normas para essa mudança, com a ação judicial é possível a obtenção de decisão para que, em tutela provisória, os recolhimentos sejam realizados com tais premissas.
A equipe do escritório Marcondes Machado e Beek está a disposição para qualquer esclarecimento.